Lugar de mulher também é na política
A performance das atletas brasileiras nos Jogos Rio 2016, a começar pela judoca carioca Rafaela Silva, ilustra à perfeição a competência das mulheres em transpor cenários adversos e superar limites – os próprios e, em muitos casos, os impostos pela desigualdade social.
Tais exemplos positivos de eficiência e obstinação transcendem a esfera do esporte: a história atesta a capacidade das mulheres brasileiras em alcançar patamares de sucesso nos mais variados segmentos. E essa tendência se fortalece pelo fato delas se mostrarem focadas na capacitação acadêmica e profissional. Segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), divulgados em 2015, o número de mulheres que ingressam no ensino superior supera o de homens, e a diferença se amplia a favor delas no universo que conclui o curso de graduação.
Por que, então, esses atributos de comprovado valor não se expandem ao exercício da política partidária pelas mulheres, pela via de assumir cargos legislativos e/ou executivos? O Brasil ocupa a vexatória 153ª. posição nesse quesito, entre 193 países pesquisados em um levantamento da Inter-Parliamentary Union (IPU), entidade com sede nos Estados Unidos que atua inclusive junto à Organização das Nações Unidas (ONU).
Nas eleições de 2012, as candidatas a assentos nas Câmaras Municipais foram 31% do total, e 12% delas – quase a metade, portanto -, concretizaram esse propósito, segundo levantamento do Instituto Brasileiro de Administração Municipal (Ibam) e do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea).
O que se observa, portanto, é o cumprimento no limite da lei de 1997 que estabeleceu em 30% o percentual mínimo de mulheres candidatas – no âmbito das eleições para Câmara dos Deputados, Câmara Legislativa, Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais. E com resultados pífios em termos da equidade de gênero na política que uma democracia consolidada requer.
A chamada Lei de Cotas não inclui a disputa pelos cargos de prefeita, governadora e presidente da República. Ainda assim, proporcionou um tímido avanço no contingente de mulheres nos executivos municipais. Em 2012, as urnas fizeram 665 prefeitas – 12% do total -, um quadro mais favorável à participação feminina do que nas duas eleições anteriores: a de 2008, com 504 prefeitas ( 9,07% do total), e a de 2004, com 404 prefeitas (7,3% do total).
Promovido recentemente em São Paulo pelo Instituto Patrícia Galvão – organização social sem fins lucrativos voltada à comunicação e aos direitos das mulheres -, o seminário “Desafios para a Igualdade de Gênero nas Eleições Municipais de 2016” trouxe à tona reflexões que não podem ser negligenciadas. Uma delas prevê que o Brasil levará 150 anos para alcançar a paridade entre homens e mulheres na política partidária. Outra informação, baseada em estudo do Instituto, detectou que não raro partidos políticos convidam mulheres para concorrer em eleições apenas para preencher a cota mínima exigida por lei. Na prática, esperam delas a condição de figurantes, não de protagonistas.
Ciente de que não me cabe julgar escolhas pessoais de ninguém – sejam mulheres ou homens -, arrisco uma análise sobre a posição claramente refratária das brasileiras em geral em adentrar essa seara. Primeiro, é patente a dificuldade, ainda hoje, delas simplesmente viverem em paz no Brasil, haja vista as afrontas com que muitas se vêem obrigadas a lidar no cotidiano. Nesse contexto, a ainda predominante má imagem do ambiente político partidário não inspira a adesão de um gênero que já precisa se defender rotineiramente de tanta injustiça.
Ainda que seja compreensível esse desinteresse, o fato é que ele reduz a potência da voz feminina, cujos clamores deveriam ecoar especialmente na esfera política, espaço onde seu trabalho pode gerar movimentos de estímulo ao pleno exercício dos potenciais não só das mulheres, mas de toda a população.
Precisamos da capacidade da mulher na política, levando sua inteligência e notório senso de justiça às administrações públicas; aos parlamentos, onde seus olhares sagazes podem propor e qualificar debates fundamentais. Há muito o que aprimorar em nosso país, nos mais variados segmentos. A equidade de gênero na política, seguramente, se constitui em um grandioso passo na conquista de cada objetivo. Brasileiras, por favor, pensem nisso.