“O gás tem tudo para ser o combustível da retomada econômica”
O deputado federal Laércio Oliveira (PP/SE) é relator do Projeto de Lei (PL) 6407/2013, chamado de Nova Lei do Gás. Pelos cálculos da Confederação Nacional da Indústria (CNI), a aprovação desse arcabouço legal no Congresso pode trazer investimentos de US$ 31 bilhões por ano ao Brasil até 2030, ao quebrar o monopólio da Petrobras na produção do gás natural. Essa abertura de mercado, argumenta Laércio, viabiliza benefícios diretos à população brasileira, como ele explica nessa entrevista exclusiva ao F5News.
Ao longo dos últimos meses, o deputado por Sergipe tem participado de sucessivos eventos online para debater os caminhos que levem à aprovação desse novo marco legal, ainda alvo de resistência por alguns Estados e em setores do Congresso. Uma das alegações centrais de Laércio é que se trata de uma oportunidade ímpar do Brasil não apenas reduzir os impactos econômicos da pandemia do novo coronavírus, como também avançar na industrialização do país, na atração de investidores estrangeiros e, consequentemente, na geração de empregos e renda. Confira:
F5News – O senhor tem colocado o mercado do gás como uma potencial redenção econômica para o Brasil. Por quê?
Laércio Oliveira – Hoje, 40% do gás produzido no país é reinjetado, ou seja, ele é colocado de volta no solo. Isso significa o desperdício de um recurso precioso para a economia brasileira e de baixo impacto ambiental, o que contempla dois caminhos de grande importância, aqui e perante os mercados externos. Por que quase a metade desse gás é usado na exploração do petróleo, como elemento de pressão para retirá-lo de poços maduros? Basicamente porque o Brasil não dispõe de dutos para o levar a consumidores diretos, às indústrias, por exemplo, que poderiam reverter esse insumo energético mais barato e, como falei, de menor impacto ambiental, em divisas, empregos e renda ao nosso país.
F5News – O senhor é o relator da chamada Nova Lei do Gás e tem se mostrado um entusiasta de seus potenciais, se aprovada. O que essa legislação representa em termos práticos para a população brasileira?
Laércio – A estimativa do governo federal é que o Brasil tenha um aumento de geração de energia de 35% com investimentos em termelétricas, nas quais o gás é um importante insumo – de novo, com muito menor impacto ambiental do que a geração térmica por outras fontes, como o carvão. Aproveitando esse aporte energético, a expectativa é que o preço da energia caia em 40% nos próximos dois anos se a Lei do Gás for aprovada. Só isso já demonstra a dimensão do benefício para a população de modo geral. Assim, esse gás vai gerar energia mais barata e mais limpa para todos; tem larga aplicação industrial, no abastecimento de veículos, na fabricação de fertilizantes, entre outros muitos usos.
F5News – Essa potencial redução de 40% no preço da energia pode chegar às contas de luz dos brasileiros?
Laércio – Sendo o gás um importante insumo para as termelétricas, a diminuição do preço do produto terá impactos positivos, sim, nas contas de luz, mas ainda não é possível prever em que percentual. Mas é importante deixar claro que o encarecimento da energia num país tende a aumentar a quantidade de energia importada na forma de mercadorias e serviços prontos. Isso, obviamente, gera impactos negativos sobre a produção, a renda e os empregos naquele país que está importando essas mercadorias e serviços, ao invés de os exportar – ou ao menos chegar à autossuficiência. Em outras palavras, a energia elétrica e o gás consumidos nas residências, pelos quais a população paga em suas contas, formam uma pequena parcela do consumo das famílias brasileiras. A maior parte está embutida na produção e oferta dessas mercadorias e serviços – e compõem seu preço final. Alguns exemplos já citados por especialistas estão na eletricidade que refrigera produtos perecíveis, como carne e pescado; que assa o pão nas padarias e que move o maquinário na fabricação de produtos de higiene.
F5 News – De que maneira a Nova Lei do Gás pode viabilizar o aproveitamento mais eficaz desse recurso natural, como o senhor tem defendido?
Laércio – A legislação proposta atua sobre vários aspectos. A produção do gás natural é ligada diretamente à extração de petróleo, em que há baixíssima concorrência, sendo o refino praticamente um monopólio da Petrobras. Em linhas gerais, o que o projeto de lei pretende é inserir o mercado do gás na mesma lógica do que já foi feito no de energia elétrica. Assim como hoje os consumidores podem comprar energia elétrica diretamente dos geradores ou das empresas comercializadoras, se o Projeto de Lei for aprovado em seus termos atuais, a companhia distribuidora de gás vai continuar sendo operada por cada Estado ou por uma empresa concessionária. Mas o produto final, o gás, poderá ser comprado de qualquer fornecedor – desde que cumprida sua habilitação criteriosa, claro. A Nova Lei do Gás corrige também gargalos tributários, especialmente sobre o ICMS.
F5 News – Como Sergipe está inserido nesse processo e qual a expectativa para o estado que o senhor representa?
Laércio – Com a descoberta dos campos de gás natural no litoral de Sergipe, a perspectiva é que o estado chegue a uma produção quatro vezes maior do que a capacidade de consumo de toda a região Nordeste. E nosso empenho é grande para que Sergipe tenha o gás mais barato do Brasil, considerando a menor distância dos campos de produção ao litoral, o que reduz significativamente o custo geral das operações. Essa circunstância faz de Sergipe um estado legitimamente favorável à expansão do parque industrial da cerâmica, por exemplo, setor cujo investimento em gás – insumo essencial à atividade – corresponde a 30% de seu custo operacional.
O Governo de Sergipe, por intermédio da Secretaria do Desenvolvimento Econômico, da Ciência e Tecnologia (Sedetec), já deu largos passos no sentido de modernizar a regulação do gás natural, fazendo de meu estado pioneiro na adequação do ‘Novo Mercado de Gás’, do Governo Federal. O regulamento dos Serviços Locais de Gás Canalizado do Estado de Sergipe e as reduções de ICMS do gás para empresas beneficiadas pelo Programa Sergipano de Desenvolvimento Industrial (PSDI) são exemplos disso.
F5News – O senhor publicou um artigo em uma revista especializada expondo a importância do gás natural para a indústria de fertilizantes. Em linhas gerais, qual é ela?
Laércio – É de extrema importância. O gás natural é o principal insumo para a produção de fertilizantes nitrogenados. E seu alto preço, um obstáculo alegado para o fechamento das Fafen da Bahia e de Sergipe. Especificamente no nosso estado, essa decisão custou a perda de cerca de três mil postos de trabalho, diretos e indiretos, em diversas empresas afins à fábrica. Principalmente com a descoberta dessa grande bacia de gás natural na costa sergipana, a hibernação da Fafen em Laranjeiras não se justificava, ainda mais a partir da entrada em operação da termelétrica no município de Barra dos Coqueiros. Esses argumentos basearam nosso trabalho incessante em defesa da fábrica, felizmente bem sucedido. Em âmbito da economia nacional, o Brasil ocupa a quarta posição entre os maiores consumidores de nutrientes minerais para fertilizantes no mundo, atrás da China, Índia e Estados Unidos. Mas, desses quatro países, o Brasil é o único que produz menos de 50% da sua demanda de fertilizantes no próprio solo. Isso gera uma saída de divisas para o setor agrícola, deixa o país vulnerável e totalmente dependente desse produto comprado o mercado internacional. O Brasil continuar produzindo fertilizantes nitrogenados é, portanto, uma questão estratégica e a redução no custo do gás natural, um caminho para alavancar o setor.
F5News – Qual o principal desafio para a aprovação da Nova Lei do Gás no Congresso?
Laércio – Alguns parlamentares refratários ao projeto de lei alegam que a nova legislação tiraria da Petrobras a operação em alguns setores. No entanto, isso não enfraquece a estatal. Ao contrário, viabiliza que ela concentre forças técnicas e receitas na extração do petróleo do pré-sal, um patrimônio grandioso do país, cuja exploração requer prioridade e investimentos vultosos. Exponho o que me parece a questão fundamental, a merecer reflexão apartidária: por quanto tempo mais o Brasil vai continuar literalmente enterrando o que pode ser, baseado em ciência, o motor para um avanço benéfico à população em todos os sentidos? A quem interessa seguir injetando no solo 40% do nosso gás natural? Ou é melhor que esse recurso seja muito melhor aplicado, num propósito que estará sob controle social, transparência, sujeito a debates e intervenções capazes de construir um caminho cuja adequação deve focar o interesse coletivo? O gás natural tem tudo para ser o combustível da retomada econômica. É preciso que a sociedade seja informada sobre seus méritos, ajude o parlamento a debater com prioridade essa proposta – espero eu, aprovando-a após as adequações que possam surgir.
Entrevista publicada no Portal F5 News